RECOMENDAÇÃO 03/2018
Dispõe sobre a imprescindibilidade da vacinação nas hipóteses delineadas pelas autoridades sanitárias e por ser um direito assegurado no art. 14 do ECA O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA, através da Promotora de Justiça infrafirmada, com supedâneo no plexo de atribuições descritas no artigo 129, IX, da Constituição Federal; artigo 75, IV, da Lei Complementar 11/96; artigo 6º, XX, da Lei Complementar nº 75/93; artigo 201, VIII e §§ 2º e 5º, “c”, do Estatuto da Criança e do Adolescente,
CONSIDERANDO que é dever institucional do Ministério Público zelar pelo acautelamento dos direitos e das garantias legais asseguradas às crianças e aos adolescentes, com a promoção, ex vi do artigo 129, II, da Constituição Federal1, das medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis;
CONSIDERANDO que ao Ministério Público é conferido, pelo artigo 129, III, da Constituição Federal2, o dever de atuar com o objetivo primaz de acautelar interesses sociais e difusos;
CONSIDERANDO que a saúde é um direito de matriz
1Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
[...]
II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia;
2Art. 129.
[...]
III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;
constitucional (artigo 6º da Constituição Federal)3, corolário do próprio direito à vida, donde provém a impossibilidade de a sua tutela ser objeto de eventual mitigação;
CONSIDERANDO que, para além de o artigo 196, caput, da Constituição Federal4, prescrever que a saúde é um direito de todos e
dever do Estado, ele referenda que a sua salvaguarda dar-se-á, dentre outros, por conduto do acesso universal e igualitário às ações e serviços para a promoção, proteção e recuperação;
CONSIDERANDO que a Convenção Sobre os Direitos da Criança, em seu artigo 24, referenda que a criança possui o direito de “[...] gozar do melhor padrão possível de saúde e dos serviços destinados ao tratamento das doenças e à recuperação da saúde. Os Estados Partes envidarão esforços no sentido de assegurar que nenhuma criança se veja privada de seu direito de usufruir desses serviços sanitários”.
CONSIDERANDO que as vacinas funcionam como importante instrumento de controle das doenças preveníveis por imunização, máxime em grupos reputados vulneráveis, sendo, elas, um dos mecanismos mais proeminentes na proteção do organismo humano contra a atuação de agentes infecciosos e bacterianos;
CONSIDERANDO que, segundo os dados fornecidos pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância – UNICEF, o decréscimo no índice de mortalidade infantil no Brasil é tributado, dentre outros fatores, à implementação de planos de vacinação mais efetivos5;
CONSIDERANDO que, ex vi do artigo 4º do Estatuto da
3 Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
4 Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
5 https://www.unicef.org/brazil/pt/Pags_008_019_Mortalidade.pdf
Criança e do Adolescente6 e sem embargos ao inquestionável dever estatal, a família não poderá deixar de empreender esforços prospectivos no sentido de assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida e à saúde do menor;
CONSIDERANDO que o artigo 14, §1º, da sobredita Lei 8.069/19907, consolida a obrigatoriedade de as crianças serem vacinadas nas hipóteses recomendadas pelas autoridades sanitárias, de modo que os pais serão responsáveis pelas sanções previstas na lei, acaso as reportadas venham a contrair eventual doença, por ocasião de sua negligência;
CONSIDERANDO que os pais poderão ser multados, quiçá perder a guarda, se a criança não foi vacinada nos casos exigidos, mormente por não se evidenciar, na presente hipótese, apenas a liberdade individual dos envolvidos, mas o próprio interesse da coletividade, materializado na impostergável necessidade de se tutelar a saúde pública;
CONSIDERANDO que o Código Penal, especificamente em seu artigo 2688, tipifica a conduta daquele que infringe determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa, cominando, ao final, pena de detenção, de um mês a um ano e multa;
CONSIDERANDO que a disseminação de notícias falsas
6 Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
7Art. 14. O Sistema Único de Saúde promoverá programas de assistência médica e odontológica para a prevenção das enfermidades que ordinariamente afetam a população infantil, e campanhas de educação sanitária para pais, educadores e alunos.
[...]
§ 1º É obrigatória a vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias.
8Infração de medida sanitária preventiva
Art. 268 - Infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa:
Pena - detenção, de um mês a um ano, e multa.
Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço, se o agente é funcionário da saúde pública ou exerce a profissão de médico, farmacêutico, dentista ou enfermeiro.
contra as vacinas, máxime por conduto das redes sociais, vem gerando confusão nos pais e responsáveis acerca dos benefícios da vacinação;
CONSIDERANDO a imperiosa necessidade de empreendermos esforços prospectivos no sentido de aplacar os efeitos gravosos desses falsos informes, considerando, sobretudo, a possibilidade de doenças historicamente erradicadas no Brasil voltarem a ser registradas;
CONSIDERANDO que, na estrutura do Sistema Único de Saúde, tem sido detectado decréscimo na adesão às campanhas de vacinação, sendo necessário o envolvimento de equipe multidisciplinar da saúde, com o escopo de atenuar os efeitos, daí derivados, bem assim de prevenir, através de campanhas de educação sanitária para pais, educadores e alunos, a causação dos danos das enfermidades que ordinariamente atingem a população infantil;
RECOMENDA:
1.À Secretaria Municipal de Saúde:
1.1 – Que empreenda a divulgação da Campanha de Vacinação e o consequente chamamento dos pais, por conduto dos meios de comunicação como aviso de utilidade pública, referendando a obrigatoriedade da vacinação das crianças, sobretudo nas hipóteses elencadas pelas autoridades sanitárias;
1.2 – Que os integrantes das Equipes de Saúde da Família, médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem, auxiliares de enfermagem, agentes comunitários de saúde, realizem palestras de conscientização da importância da vacina, como também busca ativa em seus territórios;
1.3 – Que com a Coordenação de Imunização do Município e a Gerência de Atenção Básica articule, com a Secretaria de Educação, dias e horários, previamente identificados, para que profissionais de saúde habilitados possam realizar a vacinação de crianças e adolescentes, nas escolas e creches, públicas e privadas, comunicando antecipadamente aos pais;
1.4 – Manter a adequada alimentação dos dados relativos às vacinas obrigatórias no Sistema de Informação do Programa Nacional de Imunizações (SI-PNI);
2.À Secretaria Municipal de Educação:
2.1 – Que, por escrito, emita um COMUNICADO direcionado às creches e escolas, com o escopo de chamar os pais e/ou responsáveis a realizarem a vacinação nas hipóteses reputadas necessárias, ex vi, inclusive, do art. 14, §1º, da Lei Federal 8.069/1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA;
2.2 – Que, no ato da matrícula, a SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO e ESCOLAS MUNICIPAIS exijam a apresentação do Cartão de Vacina atualizado;
2.3 – Que, no ato da matrícula, também seja assinado pelos pais e/ou responsáveis um termo de autorização, no que tange às vacinas obrigatórias relativas às campanhas nacionais e situação de atualização de caderneta vacinal, no decorrer do ano letivo;
2.4 – Que, no caso de não vacinação na escola, derivada da omissão ou negligência dos pais, comunique ao Conselho Tutelar, máxime para que as medidas protetivas descritas no Estatuto da Criança e do Adolescente possam ser aplicadas.
3.Ao Sindicato das Escolas Privadas:
3.1 – Que disponibilize, a par das Escolas Privadas, espaço físico, com o objetivo de propiciar a realização das vacinas obrigatórias, em articulação prévia com a Coordenação de Imunização do Município e a Gerência de Atenção Básica;
3.2 – Que sugira aos proprietários das escolas privadas que emitam um COMUNICADO, por escrito, aos pais e responsáveis, com o escopo de chamá-los, na esteira do multicitado artigo 14, §1º, do Estatuto da Criança e do Adolescente, para a vacinação;
3.3 – Que, a título preventivo, expeça ofício aos proprietários das escolas privadas, objetivando alertar que os casos de não vacinação que tenham conhecimento, derivados da omissão ou da negligência dos pais, deverão ser comunicados ao Conselho Tutelar, máxime para que as medidas protetivas descritas no Estatuto da Criança e do Adolescente possam ser aplicadas;
3.4 – Que também, por meio de ofício, seja referendada a necessidade de os proprietários das escolas privadas, no ato da matrícula, exigirem a apresentação do Cartão de Vacinação atualizado.
4.À Coordenação da Imunização do Município
4.1 – Que promova debates e preste esclarecimentos à sociedade em geral sobre vacinação e emita NOTAS DE ESCLARECIMENTO sobre as reportadas notícias falsas;
4.2 – Que com a Gerência de Atenção Básica articule com a Secretaria de Educação, dias e horários previamente agendados, para profissionais de saúde habilitados realizarem a vacinação de crianças e adolescentes nas escolas e creches, públicas e privadas, comunicando antecipadamente aos pais;
Os destinatários da presente RECOMENDAÇÃO deverão enviar para a Promotoria de Justiça Infância da Comarca de Capim Grosso – BA, cópia de documentações pertinentes e hábeis a demonstrar a adoção de providências para cumprimento da mesma, a fim de instruir o procedimento administrativo, que foi instaurado no âmbito desta Promotoria de Justiça para tratar sobre a vacinação de crianças no Município de Quixabeira – BA.
Registre-se e, após, encaminhe-se cópia da presente RECOMENDAÇÃO às seguintes autoridades:
a) Aos Secretários de Saúde, Educação e Desenvolvimento Social do Município, para conhecimento e divulgação na rede local e sociedade em geral;
b) Ao Presidente da Câmara Municipal, para conhecimento;
c) Ao Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente – CMDCA - do Município, para conhecimento e providências que julgar pertinentes;
d) Ao Centro de Apoio Operacional da Criança do Adolescente e da Educação (CAOCA/MPBA), para ciência, arquivo no banco de peças e disponibilização no site do MPBA;
e) À Assessoria de Imprensa do Ministério Público, para fins de publicação e divulgação;
f) Ao Conselho Tutelar do Município para os fins devidos;
g) Ao Conselho Regional de Medicina e ao Conselho Regional de Enfermagem.
Remeta-se, por fim, cópia da presente Recomendação, por e-mail, às rádios locais para a devida divulgação.
CUMPRA-SE.
Capim Grosso-BA, 03 de setembro de 2018.
CINTIA CAMPOS DA SILVA
Promotora de Justiça
Quézia Souza Silva
Estagiária do MP